Álbum: Canções Para Embalar Marujos
Gravadora: MCK
Ano: 2010
01. Primeiro Round
02. Nasci Para Chorar
03. Eu Sei
04. Como O Mar
05. Ideal
06. Black Jorge
07. Cigarros E Cafes
08. Quem Dera
09. Cançao De Um Velho Marujo
10. Chanson D´amour
11. Obsceno Amor
12. C`est La Vie
13. A Cem Por Hora
Poucas são as incursões que faço na televisão aberta. Incomoda-me os chuviscos do sinal, intervalos intermináveis, fazendo-me preferir filmes, séries e conteúdos via internet. Mas foi através de uma apresentação musical no programa do Jô que conheci a música de Renato Godá.
Seu nome sem complicações esteve em minha memória por mais de dois anos. Até que, meses atrás, adquiri seu EP, Renato Godá, lançando em 2009. Recordei imediatamente que Kamikaze fora a canção que ouvi, não só pela peculariedade de sua melodia, até então diferente de boa parte da música que ouvi, mas pela interessante letra que contrapunha sagrado e profano do amor em um ritmo antigo, homenageando velhas canções de cabaré que a deixa irresistivelmente sedutora.
Lançado em março desse ano, Canções Para Embalar Marujos é uma seqüência natural do EP, porta de entrada para o universo musical de Godá. Sua sonoridade distinta expande-se além do som, estando viva na própria persona do cantor: um músico que mantém roupas elegantes, chapéu, cabelo desgrenhado, bebidas e cigarros, representando vivamente a personagem criada em suas letras.
A fonte bebida pelo autor vem dos lugares mais periféricos da sociedade. Retoma os cabarés antigos, onde homens sem eira nem beira entregam com afinco à suas bebidas por não estarem nos braços das mulheres que amam. Errantes que vão, de bar em bar, porto em porto, procurando algo que os conforte, por uma vida, ou uma noite. Bêbados de amor não correspondido.
Primeiro Round, cujo título remete-se as lutas de boxe, recriando inevitavelmente a idéia visual de lutas clandestinas realizadas em botecos, dá a forma do amor diabólico e vulgar que permeia o álbum. “Encarei temporais / Ondas gigantescas de terror no mar / Enfrentei marginais / Que tentaram a sorte nos becos do caís”. (Primeiro Round)
Como um aventureiro que ainda que navegado pelos setes mares, conhecedor de moléstias e violência, espera, com desejo, o amor que verdadeiramente o arrebate. “Hoje vivo em suas mãos / Sou refém dos seus sinais / O seu jogo sedutor / Me levou a lona no primeiro round”. (Primeiro Round).
O idílio de tal desejo é a vida que prossegue errante. Nasci para Chorar, versão do tremendão Erasmo Carlos para canção de Dion Dimucci é deliciosamente intepretada pelo músico e banda. Ambas canções parecem completar a mesma idéia, a vida como um mar de miséria triste e dissonante.
As personagens de suas composições trafegam por esse mundo obscuro, pelas vielas repletas de amor contido, pelo choro dos bêbados por falta de amor. Um boêmio que sofre entre o amor e seus objetos pontiagudos procurando, de porto em porto, bar em bar, dama a dama, quem desperte o sentimento arrebatador. “Porém posso esquecer as horas / Abusar da memória / Pra ficar com você”. (Eu Sei)
Em nenhum momento, Godá deixa de ressaltar sua alma vadia. Estilo que salta nas músicas, fazendo nos imaginar que enquanto canta empunha um cigarro e traga uma bebida barata. A faceta do amante sedutor é ressaltada em Ideal e Quem Dera, histórias sobre amantes que, mesmo sendo amaldiçoados pela vida, trazendo consigo a chama que, de fato, acende amantes.
Dentre as que fogem de tal universo, deixando pequenos cacos fora da coesão total do álbum, está Black Jorge. Voltada para um tipo de malandragem mais contemporânea, que não tem o mesmo brilho das lágrimas ébrias dos amantes.
A explosão mais lírica, sem a crueza da vida, se faz em Chanson d´Amour, com participão de Renata Carlotti que, em dueto, alternando entre português e francês, ressaltam belas imagens contaminadas pelo amor.
Porém, sem dúvida, é o flerte com o diabólico e a decadência elegante, embalada por uma melodia rica e harmoniosa, que fazem do álbum, e de Godá, um músico de destaque.
A Cem Por Hora, que encerra as Canções é progressão direta da primeira faixa, uma verdadeira declaração de amor, que ajoelha e faz da amada uma deusa, pedindo redenção em seus braços e desejando ser o que ela quer que seja. A voz grave de Godá, acompanhada do bom refrão - "E na cidade a cem por hora / Com meu chapéu e meu Ray-Ban / Flutuar sobre o asfalto / Sem direção" (A Cem Por Hora) - finaliza de maneira precisa o álbum, como iniciou-se.
O universo musical de Godá é imenso. Povoado pelos marujos perdidos, traídos pela vida. Resultando em um bom álbum quase uníssono, que versa de maneira tão bela os sentimentos e suas contradições.
Não bastando tais fatos, o álbum - produzido por Plínio Profeta, ganhador do Grammy por Falange Canibal, do Lenine - ainda é disponível para download de maneira inteiramente gratuita. Convite impossível de não ser aceito para que você também seja mais um marujo dessas águas incríveis e turvas.
Na próxima semana: Lulu Santos, Acustivo Mtv 2 e o dvd Steve Wonder - Live At Least. Terapia Musical, todas as quintas-feiras.
Seu nome sem complicações esteve em minha memória por mais de dois anos. Até que, meses atrás, adquiri seu EP, Renato Godá, lançando em 2009. Recordei imediatamente que Kamikaze fora a canção que ouvi, não só pela peculariedade de sua melodia, até então diferente de boa parte da música que ouvi, mas pela interessante letra que contrapunha sagrado e profano do amor em um ritmo antigo, homenageando velhas canções de cabaré que a deixa irresistivelmente sedutora.
Lançado em março desse ano, Canções Para Embalar Marujos é uma seqüência natural do EP, porta de entrada para o universo musical de Godá. Sua sonoridade distinta expande-se além do som, estando viva na própria persona do cantor: um músico que mantém roupas elegantes, chapéu, cabelo desgrenhado, bebidas e cigarros, representando vivamente a personagem criada em suas letras.
A fonte bebida pelo autor vem dos lugares mais periféricos da sociedade. Retoma os cabarés antigos, onde homens sem eira nem beira entregam com afinco à suas bebidas por não estarem nos braços das mulheres que amam. Errantes que vão, de bar em bar, porto em porto, procurando algo que os conforte, por uma vida, ou uma noite. Bêbados de amor não correspondido.
Primeiro Round, cujo título remete-se as lutas de boxe, recriando inevitavelmente a idéia visual de lutas clandestinas realizadas em botecos, dá a forma do amor diabólico e vulgar que permeia o álbum. “Encarei temporais / Ondas gigantescas de terror no mar / Enfrentei marginais / Que tentaram a sorte nos becos do caís”. (Primeiro Round)
Como um aventureiro que ainda que navegado pelos setes mares, conhecedor de moléstias e violência, espera, com desejo, o amor que verdadeiramente o arrebate. “Hoje vivo em suas mãos / Sou refém dos seus sinais / O seu jogo sedutor / Me levou a lona no primeiro round”. (Primeiro Round).
O idílio de tal desejo é a vida que prossegue errante. Nasci para Chorar, versão do tremendão Erasmo Carlos para canção de Dion Dimucci é deliciosamente intepretada pelo músico e banda. Ambas canções parecem completar a mesma idéia, a vida como um mar de miséria triste e dissonante.
As personagens de suas composições trafegam por esse mundo obscuro, pelas vielas repletas de amor contido, pelo choro dos bêbados por falta de amor. Um boêmio que sofre entre o amor e seus objetos pontiagudos procurando, de porto em porto, bar em bar, dama a dama, quem desperte o sentimento arrebatador. “Porém posso esquecer as horas / Abusar da memória / Pra ficar com você”. (Eu Sei)
Em nenhum momento, Godá deixa de ressaltar sua alma vadia. Estilo que salta nas músicas, fazendo nos imaginar que enquanto canta empunha um cigarro e traga uma bebida barata. A faceta do amante sedutor é ressaltada em Ideal e Quem Dera, histórias sobre amantes que, mesmo sendo amaldiçoados pela vida, trazendo consigo a chama que, de fato, acende amantes.
Dentre as que fogem de tal universo, deixando pequenos cacos fora da coesão total do álbum, está Black Jorge. Voltada para um tipo de malandragem mais contemporânea, que não tem o mesmo brilho das lágrimas ébrias dos amantes.
A explosão mais lírica, sem a crueza da vida, se faz em Chanson d´Amour, com participão de Renata Carlotti que, em dueto, alternando entre português e francês, ressaltam belas imagens contaminadas pelo amor.
Porém, sem dúvida, é o flerte com o diabólico e a decadência elegante, embalada por uma melodia rica e harmoniosa, que fazem do álbum, e de Godá, um músico de destaque.
A Cem Por Hora, que encerra as Canções é progressão direta da primeira faixa, uma verdadeira declaração de amor, que ajoelha e faz da amada uma deusa, pedindo redenção em seus braços e desejando ser o que ela quer que seja. A voz grave de Godá, acompanhada do bom refrão - "E na cidade a cem por hora / Com meu chapéu e meu Ray-Ban / Flutuar sobre o asfalto / Sem direção" (A Cem Por Hora) - finaliza de maneira precisa o álbum, como iniciou-se.
O universo musical de Godá é imenso. Povoado pelos marujos perdidos, traídos pela vida. Resultando em um bom álbum quase uníssono, que versa de maneira tão bela os sentimentos e suas contradições.
Não bastando tais fatos, o álbum - produzido por Plínio Profeta, ganhador do Grammy por Falange Canibal, do Lenine - ainda é disponível para download de maneira inteiramente gratuita. Convite impossível de não ser aceito para que você também seja mais um marujo dessas águas incríveis e turvas.
Na próxima semana: Lulu Santos, Acustivo Mtv 2 e o dvd Steve Wonder - Live At Least. Terapia Musical, todas as quintas-feiras.