A vida é uma ópera regida pelo mestre Machado de Assis
Não é apenas no meio acadêmico – o meio em que estudo – que o escritor Machado de Assis é considerado um dos melhores escritores. Sua escrita é tão bem versada e afiada que até mesmo um dos maiores críticos americanos, Harold Bloom, colocou Machado na lista de dez maiores escritores imprescindíveis para leitura.
A façanha de Machado é grandiosa pela barreira que sua língua o impôs. Afinal, seu calibre é tão bom quanto a um Dickens, para ficarmos em um exemplo, mas não possui tanta popularidade quanto o britânico por conta de ter nascido brasileiro, uma língua pouco falada no mundo e pouco traduzida para outras línguas, exceto quando se traduzem auto ajuda ruim.
De certa maneira, inverso ao seu talento de escritor, reside as adaptações de sua obra no meio televiso ou cinematográfico, que nunca conseguiram transpor de maneira correta a pluralidade e a fluência narrativa do autor. Afinal, é complicado transformar linhas literárias em imagens.
Partindo do conceito plural de sua obra, toda segmentada em pequeno capítulos, como um folhetim, a série Capitu reescreve a obra de Machado transformando-a em uma ópera teatral filmada, onde recursos teatrais e televisivos se encontram para dar o tom e a metáfora certa para a bela e triste história de Bentinho e Capitu.
Mantendo a narrativa da obra original, a personagem de Bento Santiago, já velha, revive suas memórias afetivas e, em um monólogo direto para o público, expurgar seus sentimentos desde o nascimento de sua paixão, na infância, até seu derradeiro fim.
A ambientação da adaptação, feita quase integralmente em cenário é repleta de detalhes primorosos que enriquecem a maravilhosa narrativa de Machado. Sem se preocupar em entregar um produto simples ao público, a produção da série hora mantém em uma narrativa linear e hora se despreende da mesma, cedendo espaço para o lirismo poético das imagens e dos sons, resultando em belos momentos como o que ilustra a capa do dvd (visto ao lado) e outro em que ambas personagens de Capitu, moça e adolescente, dançam ao redor de Bentinho em uma dança meia romântica meia macabra.
O encontro entre mundos não se mantém apenas no plano entre a narrativa televisa, mais simples, e a inovação do teatro. Mas também em sua sonoridade que investe tanto em momentos que retomam músicas clássicas como outros que tocam a modernidade. A cena em que Escobar aparece pela primeira vez, e em tom grave um piano toca as notas de Iron Man da banda Black Sabbath, é de um risco e de um acerto grandioso. Assim como o belo tema entre Bentinho e Capitu, a música Elephant Gun da banda Beirut que introduz uma sonoridade que mistura o folk com indie rock.
Ainda que todo elenco da produção esteja em perfeita sintonia, é impossível não dar aplausos de pé para Michel Melamed, que interpreta Bentinho na fase adulta e conta toda sua história ao público como Dom Casmurro (nesta parte com o rosto pintado, como um personagem teatral). É ele que diversas vezes assisti a si mesmo mais jovem e, também como um espectador, ri e chora com sua própria história.
Neste ponto é necessário questionar a escolha a respeito do título da série, Capitu. Evidente que o ponto de arranque da vida de Bentinho seja os olhos de ressaca de Capitolina, porém, não vejo a personagem como alguém maior que o próprio Casmurro. É a voz de Bento que narra toda o enredo e conduz os leitores (nesse caso, telespectadores) a crer em seu lado da história. Talvez procurando uma inovação também no título que se escolheu o nome de sua contraparte como destaque. De qualquer maneira, isso é um mero detalhe passageiro.
Sensível e profundo de maneira adequada, a série marca em definitivo a história de Dom Casmurro na televisão. Evidente que nada tira o prazer da leitura da obra de Machado de Assis, mas está pequena micro série é um verdadeiro deleite.
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