terça-feira, 3 de julho de 2012

Michael Jackson, HIStory: Past, Present and Future – Book 1

Artista: Michael Jackson
Álbum: HIStory: Past, Present and Future – Book 1
Gravadora: Epic
Ano: 1995


01 - Scream featuring Janet Jackson (James Harris III, Terry Lewis, Michael Jackson, Janet Jackson)
02 - They Don't Care About Us (Michael Jackson)
03 - Stranger in Moscow (Michael Jackson)
04 - This Time Around featuring The Notorious B.I.G. (Michael Jackson, Dallas Austin, Bruce Swedien, René Moore)
05 - Earth Song (Michael Jackson)
06 - D.S featuring Slash (Michael Jackson)
07 - Money (Michael Jackson)
08 - Come Together (John Lennon, Paul McCartney)
09 - You Are Not Alone (R. Kelly)
10 - Childhood (Michael Jackson)
11 - Tabloid Junkie (Michael Jackson, James Harris III, Terry Lewis)
12 - 2 Bad featuring Shaquille O'Neal (Michael Jackson, Bruce Swedien, René Moore, Dallas Austin)
13 - HIStory backing vocals by Boyz II Men (Michael Jackson, James Harris III, Terry Lewis)
14 - Little Susie (Michael Jackson)
15 - Smile (Charlie Chaplin; John Turner, Geoffrey Parsons)


Não foi somente a transformação e evolução sonora que pontuou Dangerous. As canções possuíam alto teor de elementos pessoais da carreira de Michael Jackson e nunca mais ele desvencilharia sua música de sua história íntima.

O sucesso do rei do pop era estrondoso. As problemáticas de seu passado foram alimento altamente nutritivo para os tabloides que exploraram ao máximo qualquer fofoca a respeito de sua vida. Em resposta, Jackson começou a inserir nas letras o sentimento a respeito da fama e seu preço.

Lançado em 1995, HIStory: Past, Present and Future – Book 1 é o primeiro álbum após um delicado momento da vida do cantor em que passou por um pesado processo judicial. A temática musical eclode, portanto, em dois polos. Agressivo ou terno, sem espaço para outros sentimentos intermediários. 

Como a maioria dos elementos artísticos que definiram sua personalidade, o projeto tem uma ideia ambiciosa, mesmo sem uma inovação musical definitiva. Trata – se de um álbum duplo, cujo primeiro contém as melhores canções de sua fase adulta, e um segundo com quinze faixas inéditas.

A ideia era dialogar e representar até aqui o que teria sido Michael Jackson. O encarte é vigoroso, repleto de depoimentos de parceiros musicais, fotos de diversas épocas e imagens de shows. Curiosamente, somente três canções estão com sua letra disponível no encarte: Earth Song, D.S. e Money. O aspecto historiográfico contido no encarte contribuía para demonstrar a parte da vida de Jackson que realmente importava e significativamente o transformou em ícone. O título do álbum com as três primeiras letras grafadas em maiúsculo dialoga com o pronome possessivo em inglês HIS, explicitando de quem é a história a respeito do álbum.

Intitulado HIStory Begins, o primeiro disco apresenta as melhores e conhecidas faixas de sua carreira desde sempre. É possível ver o domínio de Thriller e Bad na seleção que, cerca de cinco anos atrás, foi lançada fora do álbum como uma coletânea simples.

O segundo, HIStory Continues, dá sequência a musicalidade de Jackson. Como no álbum anterior, desenvolvido com foco principal no CD, o disco é longo em relação aos iniciais, tendo quinze faixas. O maior tempo do álbum produz um difícil elemento na indústria fonográfica. A capacidade de mesmo longo produzir um disco coeso.

Além da música, o disco se integra de maneira imagética com diversos clipes lançados desde o lançamento, sempre com a intenção de serem inovadores, utilizando tecnologia de ponta. Alguns desses clipes serão também comentados já que as mídias se inter-relacionam. 

Quanto a crítica, estabeleci dois critérios para compreender a musicalidade de HIStory. Ouvi o disco como um álbum isolado com diversos pontos positivos. Depois procurei estabelecer sua potência dentro da carreira de Jackson, um músico que, por três vezes, realizou discos irretocáveis. Dessa maneira, antes mesmo de um faixa a faixa, considero o álbum bom e com diversos elementos interessante. Porém, estabelecido em outro patamar de Jackson, fora do olimpo anterior.

Scream, um dueto com a irmã Janet Jackson, abre o disco e transita entre a temática pessoal e o protesto. Jackson nunca pareceu tão irritado com a potência negativa do sucesso e a exploração midiática. A faixa demonstra uma tensão da figura pública irritada com o valor que dão a noticias falsas, sabendo que ele era só uma das diversas figuras exploradas pelos tabloides. É uma canção impactante, mesmo sem o brilho das primeiras faixas de outros álbuns. O clipe feito em preto e branco situa-se no espaço e é dissonante da música. Michael e Janet exibem pose demais para uma canção de protesto mas fica claro a ideia de um clipe tecnológico para época.

They Don´t Care About Us é a canção mais poderosa e icônica do álbum. O ritmo segue um batuque e a letra mantém a agressão do álbum. Dita com poucas palavras  mas evocando frases poderosas. O clipe teve versão no Brasil, encorpando mais a canção com as batidas dos tambores do Olodum. Embora o Brasil tenha sido retratado como uma gigantesca favela como representação do terceiro mundo ainda pobre, a vinda de Jackson para a gravação do clipe tornou-se notícia na época e hoje é quase um marco.

A sensibilidade está presente em Stranger In Moscow com uma explícita melancolia solitária. A canção demonstra a disfuncionalidade do álbum, trazendo demais a musicalidade com batidas eletrônicas ao mesmo tempo que, como que saudando os fãs antigos, apresentava momentos mais encorpados. A batida inicial da música é desnecessária, mas o refrão ritmado pela voz é bem realizado, dando um pouco de carga a uma balada não muito especial.

This Time Around retorna ao lado mais violento. Michael aproveitou o disco para colocar para fora a indignação e raiva que sentia perante a situação em que foi colocado. Se o músico, durante a carreira, tinha rompido diversas barreiras musicais, agora discute o quanto seu sucesso pode ser pernicioso, não escondendo nada e não se importando nem mesmo em utilizar-se de palavrões bem colocados. A canção tem swingue e o refrão, que repete o elemento clássico dos vocais em diversos tons faz a canção excelente. Sendo o quarto single do álbum.

Earth Song é a manifestação mais explícita pela causa mundial. Se Heal The World tinha uma bonita sinceridade, essa faixa carrega além da conta a denúncia, caindo em um sentimentalismo exagerado e não natural. Mas o músico sabe trabalhar canções e o instrumental em piano no começo e o coro no final dão boa estrutura a uma canção cuja letra não é eficaz.

D. S. utiliza-se de uma base parecida com Black Or White. E como Beat It tem um guitarrista convidado para ampliar a sonoridade. O título refere-se a Don Sheldon, o homem que conduziu a investigação criminal no caso de Michael Jackson, evidenciando que a vida pessoal e musical do cantor nunca mais estariam em paralelos, mas  em colisão. A parte a raiva dilacerante do músico, a canção é superficial. É necessário lembrar que na ocasião da morte do músico, o garoto que acusou Jackson disse a imprensa que foi pressionado pela família para realizar o processo. O motivo era evidente. A potencia financeira que ela poderia gerar.

O vil metal é elemento da próxima canção, Money. Canção áspera que transforma o dinheiro na arma mais suja utilizada pelo homem. A canção é repleta de rimas explícitas, o mais próximo que o próprio Jackson cantou de um rap. A letra é tão visceral que incomoda.

Como Together é canção conhecida desde Moonwalker e finalmente ganha faixa em um álbum. A escolha do cover é boa, utilizando a canção mais funkeada dos Beatles e realizando uma boa gravação que se adéqua ao estilo de sua voz, ainda mais com os versos que possuem uma pausa em seus meios.

A tristeza retorna em You´re Not Alone. Tem contornos amorosos mas o clipe ressalta a solidão de alguém tão público que não consegue mais adquirir intimidade com outros. Como balada é bem tradicional, sendo potencializada pela letra triste. No clipe, Jackson aparecia propositamente com o peito nu, combatendo especulações de que tinha marcas no corpo por causa da condição que mudou a cor de sua pele.

As confissões pessoais atingem o ápice em Childhood, tema do segundo filme de Free Willy com um músico reflexivo com o próprio passado. 

Have you seen my childhood?
I'm searching for the world that I come from
'Cause I've been looking around
In the lost and found of my heart

Você viu minha infância?
Estou procurando o mundo de onde vim
Porque tenho procurado 
no achados e perdios do meu coração.

A perfeição exigida por seu pai, que fez de Michael um grande astro, deixou marcas dolorosas. A criança retirada do cotidiano infantil. A música justifica o estilo Peter Pan de maneira sensível, produzindo no ouvinte o desconforto de um passado que não deseja ser recuperado e que foi agressivo demais. A canção é tão única que parece retirada de um momento solo de um musical.

A metralhadora verbal continua a girar em Tabloid Junkie. Canção que tem elementos semelhantes a Breaking News, primeira canção póstuma divulgada. A batida é bem próxima da de Dangerous, com teclados oitentistas e uma voz que parece dançar. Cantada em sussurro mas com força no refrão. 

Just because you read it in a magazine
Or see it on the TV screen
Don't make it factual

Só porque você leu em uma revista
ou viu em uma tela de tevê
não quer dizer que seja fato

2 Bad parece cantada como canções populares repetidas em coro. O adjetivo volta a obra do cantor como se desse outra ideia para o mesmo conceito. A crítica é voltada, dessa vez, para aqueles que vivem a ganhar dinheiro dos outros. Com participação de Shaquille O´Neil realizando o rap.

A faixa título do álbum é uma longa canção que mistura a história de Michael Jackson com a americana. Faz um resumo da agressão que o próprio músico recebeu até então em contrapartida com outras violências anônimas. O refrão aumenta a esperança, se tornando um elemento positivo para, não importando o que, sempre tentar realizar sua história e deixar um legado. Um diálogo explicito com a biografia do cantor.

Little Susie é uma densa e triste canção que narra a história da menina do título que foi assassinada. Há muita ternura e dor na voz de Jackson que parece simpatizar com a dolorosa saga da menina. Em pequisa, a história de Susie é tida como real e não há sequer um momento belo em toda sua trajetória que terminou de maneira violenta. Embora a canção seja um tanto deslocada do conceito do disco, é profunda, com tanta potência que seu contexto no álbum se torna irrelevante.

Sem perder a melacolia, Smile é uma das mais sinceras interpretações da fase adulta de Michael. A belíssima canção escrita pelo gênio Charles Chaplin sobre as desventuras da vida e a maneira com que devemos lidar com elas.

De maneira desequilibrada, HIStory é um bom disco. Mais pela potência de letras carregadas de sentimentos dispares do que pelas melodias pálidas com eletrônica exagerada. O fato de não ser um álbum coeso não retira a potência de diversas canções. Com o natural distanciamento de seu lançamento torna-se ainda mais evidente que foi um álbum difícil para Jackson gerir e as problemáticas que situavam sua vida ajudaram a produzir um álbum de altos e baixos mas repleto de dor e violência.


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