sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

O Perfume, Patrick Süskind

"No século XVIII viveu na França um homem que pertenceu à galeria das mais geniais e detestáveis figuras daquele século nada pobre em figuras geniais e detestáveis. A sua história é contada aqui. Ele se chamava Jean-Baptiste Grenouille e se, ao contrário dos nomes de outros geniais monstros como, digamos, Sade, Saint-Just, Fouché, Bonaparteetc, o seu nome caiu hoje no esquecimento, isto certamente não ocorreu porque Grenouille tenha ficado atrás desses homens das trevas mais famosos em termos de arrogância, desprezo à raça humana, imoralidade, ou seja, em impiedade."[...]
Autor: Patrick Süskind
Editora: BestBolso / Record
280 pag.

Tradução de Flavio R. Kothe


Hoje, depois de pelo menos umas três horas deitada em minha cama em no máximo duas tentativas de posição confortável, terminei de ler O Perfume - A História de um assassino (Das Parfum no título original), a belíssima obra-prima de Patrick Süskind que conta a história de um jovem que, desde pequeno, tem posse do mais extraordinário poder olfativo que jamais existiu na face da Terra.

O personagem Jean-Baptiste Grenouille é retratado na ficção como um sujeito alheio ao mundo, solitário, que nunca recebeu nenhuma forma de amor. Porém, ele tem um dom. Seu único talento, o de buscar, selecionar e categorizar aromas o leva a procurar seu verdadeiro sentido da vida: descobrir um perfume único e capaz de provocar profundo estímulo em quem sentir seu aroma.

O livro todo é cheio de referências tão bem descritas que dá ao leitor a sensação de estar dentro da loja de perfumes e especiarias de Giuseppe Baldini, ou dentro de uma cena de crime, ou diluindo em álcool suas fragrâncias preparadas para a realização de seu projeto pessoal. A narrativa, não-estática, ora nos leva a ficar na posição de Grenouille ou na dos outros personagens com quem ele convive. O narrador está sempre em uma posição de transcendência no relato dos acontecimentos, tendo o conhecimento de tudo o que está ocorrendo. A descrição dos cheiros - bons e ruins - que percorrem toda a narrativa, como disse antes, é tão importante que o narrador parece inserido nas ações de forma muito íntima.

A linguagem é um ponto marcante na história. Algumas vezes isso chegou a me assustar, pois dentro de uma descrição bela de uma fragrância, o autor utiliza-se de substantivos de forte carga semântica, como larvas, putrefação, dentre outros, que tornam o relato às vezes bastante incômodo... acredito que uma história tão destrutiva como é O Perfume garante seu tom exatamente por isso: pela maneira com que o autor trabalha as palavras positivas e negativas de forma tão brilhante.

Em 2006 foi realizada uma adaptação cinematográfica da história, mostrando as artísticas atrocidades de Grenouille. Exatamente como no livro, ele isenta seus outros quatro sentidos para dar vez a seu olfato poderoso. Algumas partes do livro não foram mostradas, como por exemplo a redenção de Grenouille após sua exclusão do mundo em sua caverna, com a ajuda do Marquês de La Taillade-Espinasse, que utiliza-se dele como cobaia em um experimento científico, ou na enorme descrição do sucesso dos perfumes de Baldini. Talvez partes significativas na história publicada em livro não tivessem significados tão importantes para o cinema, mas é um filme bastante fiel à obra literária como um todo. E o garoto que encarnou o personagem principal é extremamente verossímil, quase tão parecido quanto o Grenouille imaginado (por mim) no texto escrito...

A obra, por conta de tantos méritos, tem um espaço todo especial em minha estante de livros e em minha memória literária, dando um sentido ainda mais belo ao conceito de primeira leitura do ano.

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