Ontem dormi nas escadarias de minha casa ao fumar um cigarro com meus pensamentos. E quando vi, os pássaros me incomodavam com seus sons e a claridade machucava meus olhos, mesmo fechados. Ao mexer meu corpo, notei o quanto estava dolorido. Dormir apoiado à parede, no sereno de quase mais um inverno, não é inspirador.
Me levanto, tiro o pó de minhas roupas e volto lentamente para a casa. Sentindo gradativamente seu calor. Preciso de um banho, pensei. Mas mesmo após despertado, já estou cansado demais.
Abro as portas até a cozinha, deixo-as abertas. Tomo um copo d´água, depois outro e mais metade de um. Penso que, se a água não possui sabor nenhum, não deveríamos não sentir gosto algum? Sinto um gosto, só não consigo defini-lo.
Vou para meu quarto, acendo a luz, tiro o livro da cabeceira e abro na página marcada. Faço contas, mais ou menos há um mês o livro não sai do lugar. Não quero lê-lo mesmo querendo saber o final. Nos últimos meses esse é o quarto ou quinto que sofre esse problema.
Saio do quarto, as portas abertas trazem frio ao interior da casa. Tanto faz, penso. Pego uma folha de papel, caneta, escrevo uma frase: “Quem se beneficia?”. É estranho que apenas com essa frase eu já fora capaz de escrever.
É o que gostava de fazer. Escrever da forma que me satisfizesse, buscando algo singular, conquistando poucos leitores.
Grifo a frase que escrevi, um risco torto a lápis, “Quem se beneficia?”, penso sobre ela. Conto nos dedos da mão e somavam-se aproximadamente um ano e meio que não havia histórias que contei.
Se for uma crise, dura demais. Se quero, concluo, o que me impede? Escrevo a mesma frase na borda da página, “Quem se beneficia?”, penso. E rio, por achar que há um vilão que ganhasse lucros com minha vida doente, acordando nas escadarias da casa.
O vilão sou eu, sei disso. Mas, se sei, o que me impede de continuar? É medo de se manter igual. Levantei-me, fui à biblioteca, procurei o que já escrevi. Centenas de textos ruins, cartas de amor que nunca mandei, cartas de amor enviadas a destinatárias que não merecem nada, se não a infelicidade. Todo amor termina em cinismo, ri de mim mesmo nessa hora.
Preciso de um banho, porque não tomei quando acordei? O corpo coça, exala um cheiro que não me acostumei, mesmo com a idade.
Espalho os textos no chão, leio-os um a um. Não. Tudo é igual. Palavras repetidas infinitamente, verbos iguais, construções lexicais idênticas. Tudo que escrevi era uma segunda construção de mim. De minhas tristezas, de amores não possíveis pela minha esquizofrenia, ou pela loucura das meretrizes. Não. Eu sei até que ponto enlouqueci de verdade, e até o momento que fingi pelo romantismo.
Estou de pé vendo os papéis no chão. Penso em um gigante vendo o mundo de cima. Tudo está errado, e não consigo descobrir o porque. “Quem se beneficia?”, não. Era ridículo supor que havia vigias, homens de dedos gordos e poderes naturais.
Não. Coloco as mãos nas têmporas. Encontre a razão nisso tudo, pensei, repetindo a mesma frase, como a decorá-la. E aconteceu. Eu vi. A primeira vez que escrevi, as histórias que se seguiram desde então, amigos, amantes, pecados, dores que nunca somem e voltam, velhos bumerangues, minha loucura e o desejo de perder tudo para não ter nada. Estar vazio de si mesmo a ponto de não se reconhecer. Sim.
Sim. Consegui o que queria. Matei a figura de dentro de meus sonhos, não houve sobrevivente. Matei a mim mesmo.
Corro ao papel, escrevo meu nome por extenso embaixo da frase. Eu fui o beneficiário de meu crime. Investiguei sempre a mim e conclui no passado que a única forma de viver livre era cometendo um assassinato. Deixando tudo que se é para trás. Silêncio. Não havia motivo para matar a si mesmo, exceto por não gostar de quem se é.
Coço minha cabeça, a sujeira incomoda, não havia beneficiário. Não. Errei em meus próprios planos? Sabotei a mim mesmo ou homens estão me observando? Controle-se, não há nada de errado. Não escreva palavras que você conhece apenas pelo vício. Foque em um objeto, deixe fluir os pensamentos. Não. Eles são errados, a vida é. Quem se beneficia?
Pausa. Para dividir o silêncio com minhas dúvidas. Sei porque não escrevi mais. Não há mais eu. Livre de opiniões quando enforquei a mim, nessa sala. Eu lembro. Entre o natal passado e o último verão. Lembro do quanto agonizei. Esqueci de refazer-me. Cometi um crime sem dar a ninguém seu benefício.
...
Quatro horas mais tarde termino meus pensamentos. Garganta seca, me sinto doente, nada mais. Não há uma frase de efeito para finalizar as palavras. Assim, dou as costas e vou ao banho.
Me levanto, tiro o pó de minhas roupas e volto lentamente para a casa. Sentindo gradativamente seu calor. Preciso de um banho, pensei. Mas mesmo após despertado, já estou cansado demais.
Abro as portas até a cozinha, deixo-as abertas. Tomo um copo d´água, depois outro e mais metade de um. Penso que, se a água não possui sabor nenhum, não deveríamos não sentir gosto algum? Sinto um gosto, só não consigo defini-lo.
Vou para meu quarto, acendo a luz, tiro o livro da cabeceira e abro na página marcada. Faço contas, mais ou menos há um mês o livro não sai do lugar. Não quero lê-lo mesmo querendo saber o final. Nos últimos meses esse é o quarto ou quinto que sofre esse problema.
Saio do quarto, as portas abertas trazem frio ao interior da casa. Tanto faz, penso. Pego uma folha de papel, caneta, escrevo uma frase: “Quem se beneficia?”. É estranho que apenas com essa frase eu já fora capaz de escrever.
É o que gostava de fazer. Escrever da forma que me satisfizesse, buscando algo singular, conquistando poucos leitores.
Grifo a frase que escrevi, um risco torto a lápis, “Quem se beneficia?”, penso sobre ela. Conto nos dedos da mão e somavam-se aproximadamente um ano e meio que não havia histórias que contei.
Se for uma crise, dura demais. Se quero, concluo, o que me impede? Escrevo a mesma frase na borda da página, “Quem se beneficia?”, penso. E rio, por achar que há um vilão que ganhasse lucros com minha vida doente, acordando nas escadarias da casa.
O vilão sou eu, sei disso. Mas, se sei, o que me impede de continuar? É medo de se manter igual. Levantei-me, fui à biblioteca, procurei o que já escrevi. Centenas de textos ruins, cartas de amor que nunca mandei, cartas de amor enviadas a destinatárias que não merecem nada, se não a infelicidade. Todo amor termina em cinismo, ri de mim mesmo nessa hora.
Preciso de um banho, porque não tomei quando acordei? O corpo coça, exala um cheiro que não me acostumei, mesmo com a idade.
Espalho os textos no chão, leio-os um a um. Não. Tudo é igual. Palavras repetidas infinitamente, verbos iguais, construções lexicais idênticas. Tudo que escrevi era uma segunda construção de mim. De minhas tristezas, de amores não possíveis pela minha esquizofrenia, ou pela loucura das meretrizes. Não. Eu sei até que ponto enlouqueci de verdade, e até o momento que fingi pelo romantismo.
Estou de pé vendo os papéis no chão. Penso em um gigante vendo o mundo de cima. Tudo está errado, e não consigo descobrir o porque. “Quem se beneficia?”, não. Era ridículo supor que havia vigias, homens de dedos gordos e poderes naturais.
Não. Coloco as mãos nas têmporas. Encontre a razão nisso tudo, pensei, repetindo a mesma frase, como a decorá-la. E aconteceu. Eu vi. A primeira vez que escrevi, as histórias que se seguiram desde então, amigos, amantes, pecados, dores que nunca somem e voltam, velhos bumerangues, minha loucura e o desejo de perder tudo para não ter nada. Estar vazio de si mesmo a ponto de não se reconhecer. Sim.
Sim. Consegui o que queria. Matei a figura de dentro de meus sonhos, não houve sobrevivente. Matei a mim mesmo.
Corro ao papel, escrevo meu nome por extenso embaixo da frase. Eu fui o beneficiário de meu crime. Investiguei sempre a mim e conclui no passado que a única forma de viver livre era cometendo um assassinato. Deixando tudo que se é para trás. Silêncio. Não havia motivo para matar a si mesmo, exceto por não gostar de quem se é.
Coço minha cabeça, a sujeira incomoda, não havia beneficiário. Não. Errei em meus próprios planos? Sabotei a mim mesmo ou homens estão me observando? Controle-se, não há nada de errado. Não escreva palavras que você conhece apenas pelo vício. Foque em um objeto, deixe fluir os pensamentos. Não. Eles são errados, a vida é. Quem se beneficia?
Pausa. Para dividir o silêncio com minhas dúvidas. Sei porque não escrevi mais. Não há mais eu. Livre de opiniões quando enforquei a mim, nessa sala. Eu lembro. Entre o natal passado e o último verão. Lembro do quanto agonizei. Esqueci de refazer-me. Cometi um crime sem dar a ninguém seu benefício.
...
Quatro horas mais tarde termino meus pensamentos. Garganta seca, me sinto doente, nada mais. Não há uma frase de efeito para finalizar as palavras. Assim, dou as costas e vou ao banho.
Araraquara, terça feira, 10 de Julho de 2007.
Bela começo desse blog...e vida longa ao mesmo! O texto é muito bom... só pra destacar: "dores que nunca somem e voltam, velhos bumerangues" essa imagem é no mínimo interessante.
ResponderExcluirAté
Ohhh.... eu acho que não somos muito populares..hahahaahah
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